sábado, 25 de fevereiro de 2012

POESIA - MÁRIO DE ANDRADE

O poeta brasileiro Mário Raul de Moraes Andrade nasceu em São Paulo, a 9 de Outubro de 1893. Igualmente romancista, musicólogo, historiador, crítico de arte e fotógrafo, foi um dos fundadores do modernismo no Brasil. A criação da poesia moderna brasileira deve muito à publicação, em 1922, do seu livro «Paulicéia Desvairada». Mário de Andrade faleceu a 25 de Fevereiro de 1945, na sua cidade natal.
Poet'anarquista
Mário de Andrade
Poeta Brasileiro

Eu sou um escritor difícil
Que a muita gente enquisila,
Porém essa culpa é fácil
De se acabar de uma vez:
E só tirar a cortina
Que entra luz nesta escuridez.

(A Costela de Grão Cão)

Mário de Andrade 
BIOGRAFIA

Nascimento e morte - Mário Raul de Moraes Andrade nasceu na cidade de São Paulo, na Rua Aurora, no dia 9 de outubro de 1893. Faleceu na sua cidade natal, em 25 de fevereiro de 1945. 

Música – Em 1911, entrou para o Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, diplomando-se como professor de piano em 1917 (ano em que publicou o primeiro livro). 

Estreia – Em 1917, estreou na literatura com «Há uma gota de sangue em cada poema», um livro de poesias parnasianas inspirado na Primeira Guerra Mundial. 

Preparativos para o Modernismo – A partir da primeira obra, Mário de Andrade não deixou mais o palco das actividades literárias e artísticas, destacando-se, nos anos que se seguiram, como o principal animador do movimento que marcaria a história cultural do Brasil – a Semana de Arte Moderna, realizada em 1922. 

Inciador do Modernismo – No mesmo ano da «Semana» (1922), Mário publicou «Paulicéia Desvairada», livro de poemas logo acatado como marco do Modernismo brasileiro. A parte mais importante da obra chama-se «Prefácio Interessantíssimo» em que o autor declara a fundação do «Desvairismo». 

Professor de História da Música – Ainda em 1922, foi nomeado para a cátedra de História da Música e da Estética, no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo. Não abandonou, porém, a literatura, participando activamente da efervescência artística, ideológica e até política daqueles anos. 

Ensaio de teoria poética – Em 1925, publica a obra «A escrava que não é Isaura», verdadeira súmula da teoria poética modernista. 

Fim da fase radical – Em 1926, Mário de Andrade publica os livros «Losango Cáqui» (poesias) e «Primeiro Andar» (contos), encerrando, segundo os estudiosos da sua obra, a fase mais radical e experimentalista. 

Obras importantes – Em 1927, Mário de Andrade publicou «Amar», verbo intransitivo marcando a sua estreia no romance. Em 1928, publicou a sua obra mais lida e admirada, «Macunaíma» (rapsódia). 

«Eu sou trezentos» – Deduz-se dessa frase que Mário de Andrade foi um autor de múltiplas actividades intelectuais. Foi grande poeta, ensaísta, folclorista, crítico de arte e de literatura, além de ficcionista. 

Morte aos 51 – Mário de Andrade faleceu na sua cidade natal, em 25 de fevereiro de 1945, aos 51 anos de idade.
Fonte: www.colegioweb.com.br

ODE AO BURGUÊS

Eu insulto o burgês! O burguês-níquel,
o burguês-burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!

Eu insulto as aristocracias cautelosas!
os barões lampiões! os condes Joões! os duques zurros!
que vivem dentro de muros sem pulos,
e gemem sangues de alguns mil-réis fracos
para dizerem que as filhas da senhora falam o francês
e tocam os “Printemps” com as unhas!

Eu insulto o burguês-funesto!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros!
Fará Sol? Choverá? Arlequinal!
Mas à chuva dos rosais
O êxtase fará sempre Sol!

Morte à gordura!
Morte às adiposidades cerebrais
Morte ao burguês-mensal!
Ao burguês-cinema! ao burguês-tílburi!
Padaria Suissa! Morte viva ao Adriano!
“Ai, filha, que te darei pelos teus anos?
 Um colar… conto e quinhentos!!!
Mas nós morremos de fome!”

Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina pasma!
Oh! purée de batatas morais!
Oh! cabelos nas ventas! oh! carecas!
Ódio aos temperamentos regulares!
Ódio aos relógios musculares! Morte à infâmia!
Ódio à soma! Ódio aos secos e molhados!
Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,
sempiternamente as mesmices convencionais!
De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia!
Dois a dois! Primeira posição! Marcha!
Todos para a Central do meu rancor inebriante!

Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!
Morte ao burguês de giolhos,
cheirando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!

Fora! Fu! Fora o bom burguês!…

Mário de Andrade

EU SOU TREZENTOS...

Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cinquenta,
As sensações renascem de si mesmas sem repouso,
Ôh espelhos, ôh! Pirenéus! ôh caiçaras!
Se um deus morrer, irei no Piauí buscar outro!

Abraço no meu leito as melhores palavras,
E os suspiros que dou são violinos alheios;
Eu piso a terra como quem descobre a furto
Nas esquinas, nos táxis, nas camarinhas seus próprios beijos!

Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cinquenta,
Mas um dia afinal eu toparei comigo...
Tenhamos paciência, andorinhas curtas,
Só o esquecimento é que condensa,
E então minha alma servirá de abrigo. 

Mário de Andrade 

DESCOBRIMENTO

Abancado à escrivaninha em São Paulo
Na minha casa da rua Lopes Chaves
De supetão senti um Friúme por dentro.
Fiquei trémulo, muito comovido
Com o livro palerma olhando pra mim.

Não vê que me lembrei que lá no Norte, meu Deus!
Muito longe de mim
Na escuridão activa da noite que caiu
Um homem pálido magro de cabelo escorrendo nos olhos,
Depois de fazer uma pele com a borracha do dia,
Faz pouco se deitou, está dormindo.

Esse homem é brasileiro que nem eu.

Mário de Andrade

Sem comentários: